Simon Johnson: economias centrais e emergentes estão sujeitas a novos colapsos enquanto perdurarem as facilidades de socorro a bancos em dificuldade
Edição da London School of Economics. 294 págs.
Em 22 de julho de 2009, a British Academy entregou no Palácio de Buckingham uma carta em que se explicava a Elizabeth II por que não havia sido possível prever a irrupção da crise financeira, nem a gravidade de suas consequências. Era uma resposta a sua indagação de meses antes. Em novembro, quando estivera na London School of Economics (LSE) para inaugurar um novo edifício, a rainha havia perguntado por que ninguém havia notado que a crise estava a ponto de se manifestar. Demorou um pouco, mas enfim chegou às mãos de Sua Majestade o resultado do debate a que havia se dedicado um grupo de acadêmicos, jornalistas, políticos, funcionários do governo e outros convidados, por iniciativa conjunta da LSE e da British Academy, para refletir sobre o que perguntara Elizabeth II. Na verdade, "muitas pessoas previram a crise", dizia a carta (www.britac.ac.uk/events/archive/forum-economy.cfm) assinada por Tim Besley, professor na LSE e membro do comitê de política monetária do Banco da Inglaterra, e pelo professor e historiador Peter Hennessy. "Entretanto, a forma exata que ela tomaria, o "timing" de sua eclosão e ferocidade não foram previstos por ninguém."
Passado um ano, a LSE traz a público este ( www.britac.ac.uk/events/archive/forum-economy.cfmit0 ) assinada porTimBesley, professor na LSE e membro do comitê de política monetária do Banco da Inglaterra, e pelo professor e historiador Peter Hennessy. Entretanto, a forma exata que ela tomaria, o "timing" de sua eclosão e ferocidade não foram previstos por ninguém. " Passado um ano, a LSE traz a público este " The Future of Finance", já disponível em versão digital ( it1harr123et.wordpress.com ), para acesso gratuito, que antecede a publicação impressa programada para 16 de agosto. Será que a rainha vai ler? Deveria. Apesar do dialeto econômico ficar às vezes meio pesado, seria um modo de ela amplificar sua visão do mundo financeiro, agora sob uma perspectiva de futuro, oferecida neste livro que também resulta de debate entre pessoas de elevada qualificação – 18 nomes da elite pensante inglesa escolhidos pela LSE.
Entre as questões discutidas, todas "extraordinariamente difíceis e profundas", diz no prefácio Richard Layard, professor emérito da LSE, a principal indaga sobre qual é, ou qual deveria ser, a finalidade de um sistema financeiro global. Canalizar poupança para investimentos reais? Transferir riscos? Há uma série de respostas geralmente aceitas. Mas se olharmos de perto como as empresas financeiras trabalham, "é extraordinariamente difícil" enxergar alguma correspondência com o que está convencionalmente estabelecido – e "é frequentemente difícil explicar por que as remunerações dos executivos, assunto que no livro é tratado por Martin Wolf são frequentemente tão altas". Qualquer tentativa de esclarecimento também "deverá explicar por que o sistema é tão propenso a expansões e contrações". Os autores dos dez capítulos do livro contribuem para que se preencham esses vazios.
"A opacidade do sistema cresceu enormemente com a ampliação do uso de derivativos", observa Layard. "Isso contribui para que se tenha alto crescimento econômico no longo prazo? A questão permanece em aberto." Vários estudos, discutidos no capítulo 4, apontam para benefícios advindos da expansão dos serviços e instrumentos de crédito. Mas em todos os outros capítulos a ideia central é que o sistema financeiro precisa ser radicalmente simplificado.
Pode-se chegar a esse sistema presumivelmente mais estável por meio de regulamentação, ou de uma reforma legal-institucional, ou uma mistura das duas escolhas. Seja qual for a opção, o efeito será a redução da lucratividade dos bancos e da remuneração de seus executivos. Layard fica na pergunta: "Há chance de se fazerem as mudanças necessárias?. E remete ao último capítulo, assinado por Peter Boone e Simon Johnson, que leva o título "Will the politics of global hazard sink us again?" (A política do risco moral vai nos afundar de novo? Ou "arruinar", como também se pode entender "sink").
O nome que sobressai aqui é o de Johnson, ex-economista principal do FMI, hoje professor na Sloan School of Management do MIT, autor, com James Kwak, do nada otimista "13 Bankers – The Wall Street Takeover and the Next Financial Meltdown". Uma das vozes proeminentes da crítica à leniência com que o sistema financeiro veio sendo tratado por seguidos governos, que ele considera submetidos ao poder econômico e político de Wall Street, Johnson afirma que o atual movimento de reformas regulatórias, a começar pela agora aprovada nos Estados Unidos, não será suficiente para conter a tendência de os bancos ignorarem excessos de risco, por estarem certos de que os governos os salvarão sempre que entrarem em colapso.
Como consequência, economias centrais e emergentes – como o Brasil, que Simon menciona ao lado da Rússia – poderão acabar envolvidas num mesmo torvelinho de defaults e colapsos econômicos, na esteira desses repetidos salvamentos de emprestadores em apuros. Em seu blog ("The Baseline Scenario"), Simon afirmava, duas semanas antes da recente aprovação da reforma financeira pelo Senado americano, que, pelo visto, "essencialmente nada em toda a legislação reduzirá o potencial de maciço risco sistêmico, enquanto nos encaminhamos para o próximo ciclo de crédito".
Talvez ainda haja o que fazer. Na reunião do G-20 de novembro, em Seul, serão apresentadas propostas de atuação internacional conjunta pelo grupo de trabalho de estabilidade financeira, presidido por Adair Turner, principal dirigente do Financial Services Authority, o órgão de regulação financeira do Reino Unido. É ele quem assina o primeiro artigo do livro da LSE: "O que fazem os bancos? Por que expansões e contrações de crédito ocorrem e o que políticas públicas podem fazer a respeito?"
Algumas coisas já se sabe a respeito do que fazem (ou faziam) os bancos. Da carta de Tim Bresley e Peter Hennessy à rainha: "Embora muitas pessoas tenham previsto a crise, a maioria estava convencida de que os bancos sabiam o que estavam fazendo e acreditavam que os magos financeiros haviam encontrado novos e engenhosos modos de administrar riscos… É difícil lembrar de melhor exemplo de "wishful thinking" combinado com arrogância". O aprendizado teria sido suficiente?
Fonte: Valor Online