Avante, brasileiros, para o século XIX.
Esqueçamos Getúlio Vargas.
Tratemos de abolir a abolição da princesa Isabel.
Entremos de vez na era Eduardo Cunha.
Neguemos o que ouvimos há dois anos.
Não me representa.
Foi a expressão mais ouvida em 2013. O Congresso Nacional tomou um tranco. Deputados e senadores trabalharam fora de hora, suaram os ternos, mostraram serviço e se estressaram. Passado o susto, voltaram a ser o que sempre foram: donos da bola e malandros cheios de soberba. Continuaram a não representar os seus eleitores. Mas nunca deixaram de ter olhos para os seus patrocinadores. Quem paga a conta, cobra. Quem recebe, paga. Os parlamentares pagam com gosto. Eles só temem as ruas. Mas as ruas voltaram ao silêncio sepulcral das suas pedras. Dormem em paz. Quando urram não é para defender direitos trabalhistas. Pelo menos não em número suficiente para impressionar os que votam as nossas leis. Esses, soberanos, só ouvem os gritos dos seus patrões, os financiadores de campanha.
A atual composição da Câmara de Deputados é a mais conservadora das últimas décadas. Conservadora e esperta. O presidente da casa, Eduardo Cunha, é um mestre em chantagem. Mantém o executivo de joelho no grão de milho. Enquanto a presidente Dilma faz genuflexões para se livrar das ameaças de impeachment, a Câmara aprova medidas retrógradas como a da terceirização de todas as atividades de uma empresa. Se todo o empresariado está a favor, a razão é simples: vai gastar menos com trabalhadores. A medida desorganiza as categorias, enfraquece os sindicatos, reduz salários, flexibiliza a CLT, precariza as relações de trabalho e faz a festa dos patrões. Como o PMDB pretende manter o financiamento empresarial das campanhas políticas, o empresariado saberá retribuir fazendo generosas doações.
A empulhação é tão evidente que o governo tratou de salvar a sua parte: como não confia nas terceirizadas, boa parte nada mais do que empresinhas de fachada, convenceu a Câmara de Deputados a garantir que o INSS será recolhido pela contratante. Essa é a prova da sacanagem. De quebra, os representantes do patronato reduziram de 24 para 12 meses o tempo para recontratação de funcionários diretos como terceirizados. Vai ser uma farra. Demite, recontrata. A CLT deu os doces. Salvo se o Senado, num arroubo de dignidade, resolver salvar o legado de Getúlio Vargas e proteger os trabalhadores da mais descarada retirada de direitos dos últimos 70 anos. O ajuste fiscal do Joaquim Lévy é fichinha perto da terceirização. Claro que os deputados embalaram a calhordice com o rótulo pomposo e oco de modernidade. Essa é a palavra que sempre se usa para ferrar a plebe. Moderno é ganhar menos e trabalhar mais pelo bem do capital.
Será que o Senado terá coragem de desautorizar a Câmara de Deputados? Se não o fizer, a presidente Dilma terá coragem de vetar? Ou será durante o quarto reinado do Partido dos Trabalhadores que a Era Vargas, objetivo do desejo de exterminação de Fernando Henrique Cardoso, chegará ao fim com a morte por inanição da CLT? Tudo está em aberto. Seria interessante ver, num domingo desses, os manifestantes de 15 de março e 12 de abril, de camisa amarela, protestando contra esse saque ao patrimônio nacional. Ainda dá tempo.
O salvador da pátria agora se chama Renan Calheiros. É o fim da várzea. Ou não?
Deve ser só o começo.
Juremir Machado – Correio do Povo
Do fim.