Dezoito meses depois de anunciado, a Caixa Econômica Federal dá início hoje ao seu programa de investimentos do FGTS -do qual é gestora- para capitalização e modernização das companhias estaduais de saneamento básico. Em São Paulo, representantes do banco estatal assinarão com a Companhia de Saneamento do Mato Grosso do Sul (Sanesul) um contrato que permitirá fazer uma auditoria na empresa, capacitando-a a ser tomadora de recursos do fundo. Nos próximos 15 dias, termo semelhante será firmado com a Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa). Há negociações ainda em andamento com outras oito companhias estaduais.
O objetivo é fazer um diagnóstico e propor soluções para melhorar a saúde financeira das empresas. Isso possibilitará a elaboração de um plano conjunto de negócios, que permitirá à Caixa, com recursos do FGTS, ser acionista dessas companhias, cuja participação majoritária continuará sendo dos Estados. "É muito pouco provável que os Estados abram mão desse controle", disse ao Valor o vice-presidente da Caixa, Moreira Franco. Segundo ele, serão procurados parceiros privados para se tornarem sócios do FGTS nesses investimentos.
A ideia é que, até o fim do ano, sejam realizadas auditorias nas dez companhias para que o FGTS comece a desembolsar os recursos já disponíveis, mas que não foram ainda investidos por causa alto risco existente. "O dinheiro do FGTS é oneroso, porque não pertence à Caixa, mas ao trabalhador. Precisamos de garantias para que o recurso não seja perdido", afirma Moreira Franco.
Entre 2003 e 2009, o FGTS destinou R$ 22,6 bilhões para o saneamento, dos quais 58,7% foram contratados e apenas 25,4% desembolsados. Em março de 2009, foi lançada uma carteira administrada para atender especificamente empresas públicas e privadas com capacidade de tomar recursos. Foram aprovadas operações de R$ 553 milhões e estão em análise outras operações, avaliadas em R$ 1,5 bilhão.
Mesmo assim, as dificuldades para liberar os recursos continuaram, razão pela qual houve a decisão de promover um programa de saneamento financeiro nas empresas do setor. Surgiu, contudo, um novo problema. Para que que isso fosse possível, as companhias de saneamento teriam de abrir seus caixas para avaliação das empresas de auditoria contratadas pela Caixa Econômica Federal, o que, em muitos casos, revelaria o mau uso do dinheiro público e a forte ingerência política que, juntos, acarretavam a má gestão e a impossibilidade de se tornarem tomadoras de recursos do FGTS. As negociações em torno das condições dessas auditorias no decorrer de 2009 acabaram por atrasar o lançamento do programa. Para viabilizá-lo, foi incluído agora um termo de confidencialidade.
"É importante que dirigentes das companhias e os governadores tenham noção da importância desse programa, porque elas não poderão ter o mesmo nível de mobilização político-eleitoral que sempre tiveram. Vão precisar de metas e a principal delas será zerar o déficit de saneamento", diz Moreira Franco. Segundo o executivo, uma avaliação do Sistema Nacional de Saneamento, feita em 2006, mostrou que, das 26 empresas estaduais, apenas 4 apresentaram boas condições: São Paulo, Distrito Federal, Paraná e Minas Gerais.
Dois anos depois, um novo levantamento revelou que o quadro permanecia semelhante: 69% mantiveram o mesmo nível, 23% melhoraram e 8% pioraram. "O quadro hoje permanece o mesmo daquela época, mas agora foi dado o pontapé inicial para mudar isso", afirma. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do IBGE, apontou que 95,6 milhões de brasileiros não têm condições adequadas de coleta de esgoto e 34 milhões tem problemas com o abastecimento de água.
Fonte: Valor Econômico