Mulheres bancárias de todo o estado reuniram-se na manhã desta quinta-feira (26/10), na sede da Fetrafi-RS em Porto Alegre, para o lançamento do Coletivo de Mulheres, que irá debater temas pertinentes à luta feminista. “A ideia é fazermos deste espaço, primeiramente, um lugar de acolhida e segurança, para depois passarmos à construção de políticas que possam auxiliar na luta pela desconstrução do machismo estrutural”, explicou Cristiana Garbinatto, diretora da Fetrafi-RS e coordenadora do Coletivo.
Por mais de três horas, o grupo (no qual haviam seis homens) debateu temas relacionados à dupla jornada de trabalho feminina; à dificuldade das mulheres-mães de participarem de espaços importantes de debates e decisões, por não terem com quem deixar os filhos; à normalização da violência doméstica; ao assédio moral e sexual no ambiente de trabalho; e à necessidade de também formar homens feministas, como forma de acelerar o processo de desconstrução do machismo na sociedade.
Para Garbinatto, a participação masculina no movimento feminista é muito importante por várias motivos. Um deles está relacionado às finanças, já que os cargos de diretoria ainda são ocupados em sua maioria por homens. “Vocês, homens, precisam ter mais empatia com a causa, para que possam compreender melhor as nossas necessidades na hora de liberar uma verba para as ações propostas pelo Coletivo”, exemplificou Garbinatto.
André Santana, diretor do Sindicato dos Bancários de Santana do Livramento, disse que se sentia muito à vontade no grupo de mulheres, porque teve como referência na vida a figura da mãe. Ele ressaltou a importância da participação dos homens no movimento feminista para que as novas gerações tenham pais mais participativos na educação e cuidados com os filhos. “Para ser pai, eu me inspiro na minha mãe. Espero que, no futuro, meus filhos possam se inspirar em mim”, disse.
Feminismo x Machismo
Deise Menezes, diretora do Sindicato dos Bancários do Litoral Norte, lembrou que as pessoas em geral tendem a colocar o feminismo como uma oposição ao machismo, o é um grande equívoco. “O feminismo não é um movimento contra os homens. O feminismo é a favor da vida, da solidariedade, do compartilhamento, do reconhecimento do valor de cada um, homens e mulheres”, explicou. A sindicalista defendeu que o trabalho do Coletivo de Mulheres extrapole os muros do movimento sindical bancário. “É muito importante estarmos inseridos na sociedade como um todo. No litoral norte fazemos um movimento para levar o feminismo para as mulheres de todas as categorias. E elas compartilham experiências muito enriquecedoras”, contou.
Cuidado com a linguagem
Em relação às palavras que usamos no cotidiano, impregnado de machismo, Celia Zingler, do Sindicado dos Bancários de Santa Cruz do Sul, observou que a sociedade atual ainda reflete costumes milenares, pautados na cultura do falocentrismo. “A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi refeita para contemplar as mulheres. Nós do movimento sindical temos que cuidar muito a linguagem de gênero, porque essa descontrução do machismo também passa por isso”, justificou. Ela citou a escritora e feminista nigeriana Chimamanda Ngozi como referência para a luta, defendeu o feminismo como cultura de paz e falou sobre “palavras proibidas”. “Nunca se deve usar, por exemplo, a palavra ‘ajudar’ dentro do ambiente doméstico. Porque ‘ajudar’ não pressupõe compromisso com a divisão das tarefas de manutenção daquela casa, que não é um hotel. Todos e todas precisam colaborar e não pode haver serviçais”, ressaltou.
Machismo e capital
Raquel Gil de Oliveira, diretora de Saúde da Fetrafi-RS, lembrou que o machismo está intimamente ligado ao capitalismo, devido à necessidade de haver o opressor e o oprimido para a sustentação do sistema. “As poucas sociedades matriarcais que existem são igualitárias. O objetivo do feminismo é justamente esse: construir uma sociedade solidária em que as pessoas possam compartilhar e se ajudar. E fazer isso não é fácil, porque nós bancários e bancárias estamos inseridos em um ambiente em que o capital abstraiu a nossa subjetividade e se apropriou dela. Por isso, mais do que nunca, se faz necessária uma formação feminista voltada para mulheres e homens da categoria bancária”, defendeu.
Adoecimento mental entre mulheres
A pesquisadora Karen D’Avila, que tem se dedicado nos últimos anos a investigar o adoecimento mental na classe trabalhadora, trouxe para o debate a seguinte constatação: é assustador o número de mulheres que estão desenvolvendo doenças mentais, por fatores que vão além dos problemas pessoais de cada uma. “A partir do momento que a pessoa do sexo feminino se torna adulta e ingressa no mercado de trabalho o número de violências triplica em tal nível que ela se desorganiza, ou seja, perde o controle da própria vida. Cada vez mais e mais cedo, mulheres estão desenvolvendo quadro de depressão grave, ansiedade e fobia social, que as leva ao uso de medicações pesadas, com uma série de efeitos colaterais nocivos, para que consigam dar conta do trabalho e das ‘obrigações domésticas'”, explanou.
Encaminhamentos
Ao final, o grupo definiu os próximos passos que serão:
1. Calendário de postagens para os “21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”, de 20/11 a 11/12;
2. Construção de um calendário de lutas para 2024;
3. Encaminhar para a diretoria da Fetrafi-RS a ideia de construir nos sindicatos espaços onde as mulheres-mães possam deixar seus filhos para participar de reuniões;
4. Pleitear, junto à Fetrafi-RS e aos sindicatos uma verba fixa para financiar as ações do Coletivo de Mulheres;
5. Criação de um grupo de whatsapp com regras para postagens;
6. Reuniões mensais alternadas entre presencial (com participação dos homens) e virtual (apenas mulheres)
Texto e fotos: Maricélia Pinheiro/Verdeperto Comunicação