Proposta será encaminhada à comissão interministerial
O ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, defendeu ontem (23) a proposta de multa de 40% sobre o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para a demissão sem justa causa de empregados domésticos. Ele disse que irá encaminhar a proposta à comissão interministerial que analisa a regulamentação da Emenda Constitucional 72, que trata dos direitos dos trabalhadores domésticos.
"Nós estamos propondo a multa de 40%, [ou seja], estendendo aos trabalhadores domésticos os direitos das outras categorias", disse Dias, durante reunião com a presidenta da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Creuza Maria de Oliveira.
A proposta encaminhada pelo ministério será analisada por outros órgãos do governo que compõem a comissão. "Não há proposta definitiva do governo com relação a estes temas", observou. Além da proteção do trabalhador contra demissão arbitrária ou sem justa causa, o grupo também analisa questões como o seguro-desemprego, o FGTS, pagamento de horas extras e o trabalho noturno.
Na segunda-feira (22), o senador Romero Jucá (PMDB-RR), relator da emenda, disse que pretende apresentar proposta fixando em 10% a multa por demissão sem justa causa e 5%, no caso de acordo entre trabalhadores e patrões. Os trabalhadores domésticos se posicionaram contrários à proposta que, de acordo com a Fenatrad, seria um retrocesso na garantia dos direitos da categoria. "A gente é contra 10% ou 5%. Mesmo se for 39,99% é diferente dos outros trabalhadores. A gente lutou por equiparação de direitos com os trabalhadores deste país", disse a presidenta da entidade, Creuza Maria de Oliveira. "Já colocamos a nossa insatisfação ao senador Romero Jucá com relação às propostas que estão sendo sugeridas", completou.
Para o ministro Manoel Dias, há possibilidade de se construir uma proposta conjunta do Executivo e da comissão mista do Congresso, que também trata do tema. "Essas duas propostas, a do governo com a do Congresso, certamente vão se agrupar e se transformar em um único projeto". Mas ressaltou que a decisão final é do Parlamento. "Todas as propostas serão submetidas ao Congresso Nacional, que é soberano, e terá condições de alterar as propostas que nós elaboramos, isso vai depender do debate a ser feito no Congresso".
Com relação ao modelo unificado de cobrança das contribuições pagas pelos patrões – referentes à aposentadoria dos empregados, do FGTS e do seguro por acidente de trabalho – Dias disse que os sistemas da Caixa Econômica e da Receita Federal estão sendo ajustados e, assim que a proposta for aprovada, os programas serão disponibilizados. A ideia do pagamento dos tributos em via única, uma espécie de Supersimples, para os empregados domésticos foi apresentada na comissão mista do Congresso.
O ministro também anunciou o lançamento de uma cartilha com perguntas e respostas sobre os direitos do trabalhador doméstico que começará a ser distribuída em todo o país a partir de amanhã (24).
Com mais diaristas, cai jornada de trabalhadoras domésticas
Para empregadas domésticas, o sonho de boa parte dos trabalhadores se concretizou nos últimos anos: elas conseguiram reduzir sua jornada, sem que isso se convertesse em salários menores. Ao contrário, o rendimento da categoria só cresceu desde 2004.
Dados do IBGE compilados pela Folha mostram que a jornada média de trabalho dos empregados domésticos caiu de 39,2 horas/semanais, em 2002, para 37,7 horas em 2012. Trata-se de uma redução de 4%, percentual de queda significativo para esse indicador, segundo o instituto.
A tendência de diminuição da jornada manteve-se em 2013 e os trabalhadores da categoria se ocuparam, em média, 36,9 horas/semanais no primeiro bimestre deste ano.
Em grande medida, essa evolução é resultado de uma migração de domésticas que antes trabalhavam como mensalistas para a condição de diaristas.
O determinante é que mais domésticas dormiam no emprego e ficavam mais horas à disposição dos patrões, segundo Cimar Azeredo Pereira, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE.
Desse modo, a jornada era ampliada, apesar do aumento da formalização da categoria nos últimos anos.
Com o custo maior de manter uma mensalista, afirma Pereira, muitas famílias optaram por diaristas, o que fez cair o número médio de horas semanais trabalhadas nos últimos anos.
"A faxineira tem um rol de tarefas a cumprir. Ela faz o serviço e vai embora, muitas vezes antes mesmo de os patrões chegarem em casa. Isso não acontece com as mensalistas", diz.
TENDÊNCIA
Segundo o coordenador do IBGE, essa tendência é anterior à PEC das Domésticas (que introduziu o pagamento de horas extras à categoria) e está relacionada à expansão da renda e à redução da oferta de empregados desse grupo.
Flávia dos Santos, 29, que deixou de trabalhar por mês há um ano, ilustra esse movimento. Em busca de uma remuneração maior, ela largou a casa onde trabalhava com carteira assinada, no Méier, subúrbio do Rio, e arrumou faxina em três lugares diferentes.
De quebra, passou a trabalhar menos. "Eu não dormia no serviço, mas sempre ficava até tarde. Agora, o horário é mais controlado e eu tenho ainda o sábado livre", disse a diarista que cobra R$ 100 por dia.
Assim como Flávia, a categoria como um todo teve seu trabalho valorizado. De 2004 a fevereiro de 2013, a renda dos empregados domésticos cresceu 61%, enquanto a de todos os trabalhadores avançou 36%, em média.
Os dados de 2003 foram excluídos dos cálculos porque, em tempos de crise, o emprego doméstico é um refúgio de mulheres que procuram complementar a renda familiar ou compensar a perda de rendimento em caso de demissão do marido -naquele ano, o desemprego subiu e a renda caiu em quase todas as categorias.
MUDANÇAS
Para João Saboia, economista especializado em mercado de trabalho e professor da Universidade Federal do Rio, a nova PEC deve alterar mais a realidade das mensalistas que dormem no trabalho e, por isso, tendem a enfrentar uma jornada maior.
Já mensalistas e diaristas que vão e voltam para casa não devem viver mudanças significativas, diz Saboia.
Maria Alice Santos, 50, é um exemplo da nova relação de trabalho. Ela está em aviso prévio, após nove anos de trabalho com carteira assinada na mesma casa, no Encantado, também no Rio.
Em comum acordo com a patroa, decidiu passar a trabalhar duas vezes por semana. Para compensar, vai se ocupar mais dois dias na casa de uma prima da patroa.
"Vai ser melhor. Vou ganhar mais e ter ainda três dias de folga na semana", diz.
*Agência Brasil com Folha Online